Integrais Triplas: Mudança de Coordenadas

Parte 2

Contexto Histórico (1961-1964)

CONTEXTO

Missões Espaciais (1961-1964)

Durante este período, a NASA lançou as primeiras missões tripuladas do Programa Mercury e iniciou o Programa Gemini. O voo orbital de John Glenn em 1962 exigiu cálculos precisos de trajetória. A União Soviética, com Yuri Gagarin (1961) e Valentina Tereshkova (1963), também precisou de modelagens matemáticas sofisticadas para suas missões.

NECESSIDADE

Sistemas de Referência Múltiplos

O planejamento de trajetórias espaciais exigia a integração de volumes irregulares em diferentes sistemas de coordenadas. Para otimizar os cálculos de combustível, massa e centros de gravidade, engenheiros alternavam entre coordenadas cartesianas, cilíndricas e esféricas, cada uma oferecendo vantagens para diferentes componentes das espaçonaves.

Produto Misto: Base para o Jacobiano

Definição e interpretação:

\[(\vec{a} \times \vec{b}) \cdot \vec{c} = \det \begin{pmatrix} a_1 & a_2 & a_3 \\ b_1 & b_2 & b_3 \\ c_1 & c_2 & c_3 \end{pmatrix}\]

Propriedades importantes:

  • O resultado é um escalar (número real)
  • Representa o volume do paralelepípedo definido pelos vetores
  • É positivo se os vetores formam um sistema destro
  • É zero se os vetores são linearmente dependentes

Volume Definido por Três Vetores

O volume de um paralelepípedo definido por três vetores \(\vec{a}\), \(\vec{b}\) e \(\vec{c}\) é:

\[V = |(\vec{a} \times \vec{b}) \cdot \vec{c}|\]

Se considerarmos incrementos de coordenadas \(d\vec{r} = (dx, dy, dz)\), o elemento infinitesimal de volume é:

\[dV = dx \, dy \, dz\]

Este é o volume do paralelepípedo infinitesimal com arestas \((dx,0,0)\), \((0,dy,0)\) e \((0,0,dz)\).

Ao mudar de coordenadas, este volume se transforma, e precisamos do Jacobiano como fator de correção para preservar a medida física correta.

Visualização: Volume Vetorial

Teorema da Mudança de Variáveis

Definição formal para integrais triplas:

\[\iiint_E f(x,y,z)\,dV = \iiint_D f(g(u,v,w))\left|\frac{\partial(x,y,z)}{\partial(u,v,w)}\right|\,du\,dv\,dw\]

Onde:

  • \(E\) é a região no sistema \((x,y,z)\)
  • \(D\) é a região no sistema \((u,v,w)\)
  • \(\left|\frac{\partial(x,y,z)}{\partial(u,v,w)}\right|\) é o determinante Jacobiano

O Jacobiano como Fator de Correção de Volume

O Jacobiano da transformação de \((u,v,w)\) para \((x,y,z)\) é:

\[\left|\frac{\partial(x,y,z)}{\partial(u,v,w)}\right| = \begin{vmatrix} \frac{\partial x}{\partial u} & \frac{\partial x}{\partial v} & \frac{\partial x}{\partial w} \\ \frac{\partial y}{\partial u} & \frac{\partial y}{\partial v} & \frac{\partial y}{\partial w} \\ \frac{\partial z}{\partial u} & \frac{\partial z}{\partial v} & \frac{\partial z}{\partial w} \end{vmatrix}\]

Interpretação geométrica:

  • As colunas representam os vetores \(\vec{r}_u\), \(\vec{r}_v\) e \(\vec{r}_w\)
  • O Jacobiano é o produto misto desses vetores: \((\vec{r}_u \times \vec{r}_v) \cdot \vec{r}_w\)
  • Mede a taxa de mudança do volume ao passar de um sistema para outro

Elemento de volume transformado:

\[dV = \left|\frac{\partial(x,y,z)}{\partial(u,v,w)}\right|\,du\,dv\,dw\]

Coordenadas Cilíndricas

Definição formal:

\[ \begin{align} x &= r\cos\theta \\ y &= r\sin\theta \\ z &= z \end{align} \]

Domínios das variáveis:

  • \(r \geq 0\): distância radial do eixo z
  • \(0 \leq \theta < 2\pi\): ângulo no plano xy
  • \(z \in \mathbb{R}\): altura ao longo do eixo z

Interpretação física:

Sistema natural para objetos com simetria cilíndrica, como tanques de combustível, módulos de comando e estágios de foguetes. Facilita o cálculo de volumes, momentos de inércia e distribuições de massa em estruturas cilíndricas.

Visualização: Coordenadas Cilíndricas

Para visualizar interativamente as coordenadas cilíndricas, acesse:

Visualizador de Coordenadas Cilíndricas

No visualizador, você poderá:

  • Ajustar o raio (r)
  • Modificar o ângulo (θ)
  • Alterar a altura (z)
  • Observar a transformação entre coordenadas cilíndricas e cartesianas
  • Rotacionar e fazer zoom na visualização 3D

Elemento de Volume em Coordenadas Cilíndricas

Calculando o Jacobiano para coordenadas cilíndricas:

\[\left|\frac{\partial(x,y,z)}{\partial(r,\theta,z)}\right| = \begin{vmatrix} \cos\theta & -r\sin\theta & 0 \\ \sin\theta & r\cos\theta & 0 \\ 0 & 0 & 1 \end{vmatrix} = r\]

Elemento de volume resultante:

\[dV = r \, dr \, d\theta \, dz\]

Fórmula geral para integrais triplas em coordenadas cilíndricas:

\[\iiint_E f(x,y,z)\,dV = \iiint_D f(r\cos\theta, r\sin\theta, z) \, r \, dr \, d\theta \, dz\]

Regiões em Coordenadas Cilíndricas

Tipos comuns de regiões e seus limites de integração:

  • Cilindro de raio \(a\) e altura \(h\): \[0 \leq r \leq a, \; 0 \leq \theta < 2\pi, \; 0 \leq z \leq h\]
  • Cone de raio \(a\) e altura \(h\): \[0 \leq r \leq \frac{a}{h}z, \; 0 \leq \theta < 2\pi, \; 0 \leq z \leq h\]
  • Região entre dois cilindros concêntricos: \[a \leq r \leq b, \; 0 \leq \theta < 2\pi, \; c \leq z \leq d\]

Coordenadas Esféricas

Definição formal:

\[ \begin{align} x &= \rho\sin\phi\cos\theta \\ y &= \rho\sin\phi\sin\theta \\ z &= \rho\cos\phi \end{align} \]

Domínios das variáveis:

  • \(\rho \geq 0\): distância da origem
  • \(0 \leq \phi \leq \pi\): ângulo polar (em relação ao eixo z)
  • \(0 \leq \theta < 2\pi\): ângulo azimutal (no plano xy)

Interpretação física:

Sistema natural para objetos com simetria esférica, como campos gravitacionais, tanques esféricos de combustível e cápsulas espaciais. Particularmente útil para descrever trajetórias orbitais e campos de força centrais.

Visualização: Coordenadas Esféricas

Para visualizar interativamente as coordenadas esféricas, acesse:

Visualizador de Coordenadas Esféricas

No visualizador, você poderá:

  • Ajustar o raio (ρ)
  • Modificar o ângulo azimutal (θ)
  • Alterar o ângulo polar (φ)
  • Observar a transformação entre coordenadas esféricas e cartesianas
  • Rotacionar e fazer zoom na visualização 3D

Elemento de Volume em Coordenadas Esféricas

Calculando o Jacobiano para coordenadas esféricas:

\[\left|\frac{\partial(x,y,z)}{\partial(\rho,\phi,\theta)}\right| = \begin{vmatrix} \sin\phi\cos\theta & \rho\cos\phi\cos\theta & -\rho\sin\phi\sin\theta \\ \sin\phi\sin\theta & \rho\cos\phi\sin\theta & \rho\sin\phi\cos\theta \\ \cos\phi & -\rho\sin\phi & 0 \end{vmatrix} = \rho^2\sin\phi\]

Elemento de volume resultante:

\[dV = \rho^2\sin\phi \, d\rho \, d\phi \, d\theta\]

Fórmula geral para integrais triplas em coordenadas esféricas:

\[\iiint_E f(x,y,z)\,dV = \iiint_D f(\rho\sin\phi\cos\theta, \rho\sin\phi\sin\theta, \rho\cos\phi) \, \rho^2\sin\phi \, d\rho \, d\phi \, d\theta\]

Regiões em Coordenadas Esféricas

Tipos comuns de regiões e seus limites de integração:

  • Esfera de raio \(a\): \[0 \leq \rho \leq a, \; 0 \leq \phi \leq \pi, \; 0 \leq \theta < 2\pi\]
  • Hemisfério superior: \[0 \leq \rho \leq a, \; 0 \leq \phi \leq \frac{\pi}{2}, \; 0 \leq \theta < 2\pi\]
  • Setor esférico: \[0 \leq \rho \leq a, \; \alpha \leq \phi \leq \beta, \; \gamma \leq \theta < \delta\]
  • Casca esférica: \[a \leq \rho \leq b, \; 0 \leq \phi \leq \pi, \; 0 \leq \theta < 2\pi\]

Problema: Tanque de Combustível Cilíndrico

Problema: Um tanque de combustível cilíndrico para o terceiro estágio do foguete Saturn I tem raio de 1,5 metros e altura de 3 metros. O combustível tem densidade variável dada por \(\rho(x,y,z) = 800 + 50(x^2 + y^2)\) kg/m³, onde o eixo z coincide com o eixo do cilindro e a origem está no centro da base inferior.

  1. Configure a integral tripla para calcular a massa total de combustível
  2. Converta para coordenadas cilíndricas
  3. Calcule a massa total de combustível no tanque

Dados:

  • Raio do tanque: \(R = 1.5\) m
  • Altura do tanque: \(h = 3\) m
  • Densidade: \(\rho(x,y,z) = 800 + 50(x^2 + y^2)\) kg/m³

Solução: Tanque de Combustível

1. Configurando a integral em coordenadas cartesianas:

O volume do tanque em coordenadas cartesianas seria:

\[V = \{(x,y,z) \mid x^2 + y^2 \leq (1.5)^2, 0 \leq z \leq 3\}\]

A massa é dada pela integral da densidade sobre o volume:

\[m = \iiint_V \rho(x,y,z)\,dV = \iiint_V [800 + 50(x^2 + y^2)]\,dV\]

2. Convertendo para coordenadas cilíndricas:

Substituindo \(x = r\cos\theta\), \(y = r\sin\theta\), \(z = z\) e \(dV = r\,dr\,d\theta\,dz\):

\[m = \int_0^3 \int_0^{2\pi} \int_0^{1.5} [800 + 50r^2] \cdot r\,dr\,d\theta\,dz\]

\[m = \int_0^3 \int_0^{2\pi} \int_0^{1.5} [800r + 50r^3]\,dr\,d\theta\,dz\]

Solução: Cálculo Final

3. Calculando a integral:

Primeira, integramos em relação a \(r\):

\[\int_0^{1.5} [800r + 50r^3]\,dr = \left[400r^2 + \frac{50r^4}{4}\right]_0^{1.5} = 400(1.5)^2 + \frac{50(1.5)^4}{4} = 900 + 31.64 = 931.64\]

Agora integramos em relação a \(\theta\):

\[\int_0^{2\pi} 931.64\,d\theta = 931.64 \cdot 2\pi = 5855.9\]

Finalmente, integramos em relação a \(z\):

\[\int_0^3 5855.9\,dz = 5855.9 \cdot 3 = 17567.7\]

Portanto, a massa total de combustível é aproximadamente 17568 kg.

Aplicação Histórica

APLICAÇÃO HISTÓRICA

Programa Gemini (1965-1966)

A missão Gemini utilizou intensamente diferentes sistemas de coordenadas para cálculos de trajetória. Para as manobras de acoplamento, engenheiros da NASA alternavam entre coordenadas cartesianas (para navegação global) e cilíndricas/esféricas (para aproximação relativa). Estes cálculos eram críticos para o primeiro acoplamento bem-sucedido na Gemini 8 (1966), onde Neil Armstrong e David Scott realizaram técnicas de encontro espacial essenciais para futuras missões Apollo.

Conexões com outros conceitos matemáticos:

  • Cálculo de trajetórias usando campos vetoriais
  • Integração de seções de combustível usando técnicas de Pappus
  • Otimização de recursos usando integrais múltiplas

Próximos Passos: Parte 3

No próximo módulo abordaremos:

  • Aplicações Físicas de Integrais Triplas
  • Cálculo de centro de massa em sistemas tridimensionais
  • Momentos de inércia para diferentes geometrias
  • Aplicações para planejamento de missões espaciais
CONTEXTO

Programa Apollo (1967-1972)

Veremos como as técnicas de integração tripla foram fundamentais para os cálculos de estabilidade e balanceamento do Módulo Lunar Apollo, permitindo o pouso bem-sucedido na superfície lunar.